poesia de inspiração angolana
Quarta-feira, 30 de Janeiro de 2019
retorno

Retorno ao teu solene semblante,

à imagem da tua face determinada e triste,
registada naqueles fratricidas tempos,
talvez depois de teres estado naquela morgue de Luanda...
 
Talvez então fosse o teu pensamento levado para a tristeza,
aproveitando o luto que caiu sobre o teu coração de menina...
 
Talvez então o choque dos cadáveres empilhados
te tenha deixado em petrificação,
ganhando aparência de serenidade...
 
Da tua doçura juvenil ficaram teus olhos
castanhos num olhar parado,
que um olhar de admirador fixou...
 
Pela minha paixão por esse teu rosto,
ao Alto Bimbe subi, para resgatar teu coração...
De lá trouxe a eterna e triste paixão,
mas o teu coração não...
 
A esse semblante
sempre retorno,
sempre para chorar,
para lavar minha alma dorida...


publicado por zé kahango às 20:34
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Terça-feira, 12 de Fevereiro de 2013
Longínqua Luz

I.

 

de longe vêem

imagens, vultos;

lentos, entre as nuvens

de poeira, areia esvoaçante

do meu caminho deserto...

 

ecoam sua voz sobre as dunas

de longe me falam me dizem

o ponto que hoje faço

do Passado e do Futuro

igualmente dista;

 

Perto de mim -

tão perto do peito

que me doi seu âmago -

essa distância que apenas

me separa da Luz.

 

 

II.

 

ao longe vistas

ao longo do largo rio

pelas areias da margem

pelas pedras do outro lado;

 

Cimbebasia se diziam

terras de Ovampo

terras do berço

de todos os homens

- perto por isso de todos,

dentro de cada um;

 

interior deserto

pelo grande rio banhado

perto, tão perto

da Luz

que de longe vem.

 

 

III.

 

as mais antigas,

mais profundas

margens ardentes,

águas entrando e saindo

das entranhas;

 

que nada aqui estranho,

aqui nasci, e depois

de me deitar, aqui renasço

como a Luz,

sendo d'Ela, como Ela.

 

Daqui parti

para o chão da minha amada,

pela serra que me leva,

que em planalto se eleva.

 

...para longe, em dourados reflexos

pelo caminho da Luz.





publicado por zé kahango às 06:56
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Segunda-feira, 14 de Dezembro de 2009
...

queria agora não me lembrar
do murmurejar nas valas,
da luz da Humpata

queria agora não me lembrar
de no paraíso à noite olhar
procurando o Cruzeiro do Sul

queria agora não me lembrar
da goiaba, do leite azedo

lá estar não posso,
lá estar no tempo eterno

queria agora não ter de me lembrar



publicado por zé kahango às 22:44
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Domingo, 11 de Janeiro de 2009
Soando o chifre...
 

Fazei soar o chifre de olongo!

 

que sobre o largo horizonte

o seu toque se espalhe...

 

notícias, mukandas, novidades,

velozes voam, sobre a terra,

sobre o deserto,

subindo à serra;

 

antecipando viagens,

aquietaram-se os bois nos sambos,

silenciando encostos de chifres,

espectando pelas novas;

 

esperando novas também os homens,

fazendo fumegar os cachimbos,

sabendo que terão de conduzir as manadas

para outras paragens...

 

o fim da espera ao longe já surge;

de movimento, o tempo urge.



publicado por zé kahango às 02:34
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Segunda-feira, 20 de Outubro de 2008
AQUI



Aqui, onde tudo à volta falta;
aqui. Por todos quantos se voltaram
e ficando por aqui, se desdobraram
em visões, construindo horizontes,
quando por aqui - se as viram...

Aqui: onde nada falta à volta;
aqui, os quais tantos e tão vistos foram
quando de aqui se desgarraram
e, aos baldões, embarcando p'las pontes
- quando os de ali rumorejavam...

(Rumores sombrios, daqui e dali,
nos trouxeram fios, em que me feri.
Das sombras malditas, das trevas da cobiça:
dores infinitas, sanguínea liça...)

Quando e aqui, ontem e hoje,
se viram caminhantes
- tão virgens como os de antes,
tão espantados;
aqui chegados,
onde tudo nasce;
e se antes se partiu,
hoje se volta.

Quando aqui nasce o Mundo,
a Vida irrompe;
de uma Natureza atávica
gerando o Bem mais profundo;
aqui brota a Humana Fonte,
aqui é África!



publicado por zé kahango às 21:31
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Domingo, 7 de Setembro de 2008
PÁTRIA

Neste Mundo tão redondo,

se longe estou, perto a sinto;

se me perguntas, que respondo?

Se em casa, nunca faminto!

 

Nela tenho meus Irmãos,

Pais, Filhos e Avós;

esperando por todos nós,

confiantes, dando-se as mãos.

 

O que vale uma bandeira,

o que valem as memórias;

que valem lutas e glórias?

 

Vermelha já é a terra;

e quente, se o coração nos cerra...

E após chuva, que bem cheira!



publicado por zé kahango às 00:27
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Sexta-feira, 4 de Julho de 2008
que dizer?

que dizer se procuramos,
continuamente indagando
nossas dúvidas...

que dizer, poetas angolanos?
lembrai os poetas andaluzes,
que uma luz mais crua cantaram...

que dizeis, meus amigos,
de uma Terra-Gigante,
que se rasga, que se alarga,
em doces tons de cores vivas...

que se eleva, queimando lixos,
queimando ervas daninhas

sob a doce luminosidade
de eternos ocasos, de tempo parado

de tempo pronto, de tempo sem espanto
(espantosos e espantados eram os andaluzes)
mas onde vós estais nunca o sol se põe

é tudo de manhã
e te levantaste cedo,
foste ao quintal e comeste pitangas



publicado por zé kahango às 14:20
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Terça-feira, 25 de Março de 2008
FALA DO MUKULO-KULO


Que sabes tu, dengue yanguê , do sofrimento?

Que sabes tu de pés gretados pela longa viagem,
que sabes do cansaço do caminhante?

Tatiê , tatiê ! Hu-um !

Dengue yanguê, irmão meu:
imaginar maldades está vedado a almas caridosas como a tua!

Meu amigo, irmão meu,
souberas tu a dor do meu peito, a aflição,
por reencontrar aquela que me prende o coração,
do desepero com que por ela tenho procurado!...

Souberas tu da ferida,
ferida viva que me atormenta os dias,
que um ácido diário corroi, impedindo-a de sarar...

Souberas o nome - ajudar-me-ias -
da indiferença, do desprezo,
dunas do deserto que palmilho...

Como sob as pontiagudas pedras que calcorreio
desapareceu a esperança,
como escassa água em solo ressequido...

Ah, amigo meu, irmão da minha alma, já se me fraquejam os passos
- que a voz há muito emudeceu!

Dengue yanguê :
não queiras disto saber,
que um mukulo-kulo pouco importa.

Poupa a tua mente formosa a estes lamentos,
que pelo deserto sigo o meu caminho.

Mas - kitawela ! - nem penses
em deitar-me um olhar de comiseração,
que ainda não se me romperam os nonkakos !



publicado por zé kahango às 14:56
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Terça-feira, 16 de Outubro de 2007
CINCO BELEZAS DE ANGOLA - 5

A caminho do planalto

ao cair da noite quente...

 

...longas tranças pelos meus dedos deslizaram

sobre a pele de seda de uns ombros

meus lábios pousaram...

 

No Cuangar subi ao planalto...



publicado por zé kahango às 04:39
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CINCO BELEZAS DE ANGOLA - 4

os que brandiram a zagaia,

os alegres,

os de serra-abaixo,

os kuvale,

em Capangombe pastam suas manadas




publicado por zé kahango às 04:38
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CINCO BELEZAS DE ANGOLA -3

para que lhe não fugisse

a minha alma de guelengue

na doce calma de Quilengues

um inocente olhar tanto me disse



publicado por zé kahango às 04:37
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CINCO BELEZAS DE ANGOLA - 2

Para trás ficara o Viriambundo,

seguia para lá da Cahama,

rumara ao Sul procurando

a sua princesa cuanhama.

 

O Cunene atravessara,

na margem certa estava;

os embondeiros assinalavam

o que para a vida inteira não chegava.

 

Gastos os nonkakos,

nas pedras e secas mulolas,

eis que lhe surgiu, como miragem.

 

Foi forte visão, contrastada,

impacto brutal, choque solar.

 

Tomou-se-lhe de amores, o meu amigo

- perdeu-se, ou encontrou-se...

 

Ah, destino da tristeza:

nos braços de ébano se acabar,

nos lábios do maboque o sabor,

da Cuanhama Princesa.



publicado por zé kahango às 04:34
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CINCO BELEZAS DE ANGOLA - 1

Ah, amigos meus! A paixão me prende...

aos lábios dessa Muíla, desde esse dia.

 

Presos meus olhos aos seus encantos,

à espera do seu olhar

sangra-me o peito na demora

de saber o seu sabor...



publicado por zé kahango às 04:33
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MUCANCALA

Do oriental setentrião,

do lendário Gengis Cão,

veio em perdida emigração.

 

Atravessados vales, subidas serras,

escalados montes, achadas as fontes,

encontrou as prometidas terras.

 

Aqui um povo encontra seu destino,

sua paz, seu sorriso de menino.

 

Em remotos genes, a eterna Alma

que em África sempre se renova.



publicado por zé kahango às 04:32
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BOSQUÍMANE

conheces o cheiro dos mutiatis

quando a noite cai sobre o mato

e no seu mistério estás em casa



publicado por zé kahango às 04:31
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MUHUMBE

Orelhas de elefante no penteado,

logo do Cunene desçam as águas

seguirás para Nameculungo.

 

Verás que não perdes a festa do tchindere.




publicado por zé kahango às 04:30
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MUXIMBA

Num sereno chão que germina,

numa solidão de quem só o imagina,

um povo curte suas peles,

e de suaves argilas se enfeita.

 

Não longe de Epupa,

onde as águas troam

em apertada garganta,

no teu kimbo te vi,

em tons de ocre,

irmã das pedras.



publicado por zé kahango às 04:28
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RAPARIGAS DO CUAMATO

Há batuque em Ondjiva.

São as mulheres guerreiras.

Se não as vês da picada,

podem estar atrás dos embondeiros.

 

Segue o som dos n'gomas,

cada vez mais forte,

já estamos perto.

 

Esta é a terra das grandes batalhas.

Tão árida que o sangue não empapou.

Por isso são vermelhos os panos.

 

Onde houve morte tem de haver nova vida.

Por isso aqui têm de estar as mulheres.

E por isso as suas cabeças se tingem de vermelho.

 

E não pára o batuque.



publicado por zé kahango às 04:23
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MUCUBAL

Mãe dos pastores,

do deserto solene a altivez

levas em teu plácido rosto.

 

Vais segura da eternidade,

serena como os bois que guardas,

como ainda os segredos do nonpeke.

 

Gioconda do Iona

chamar-te-iam os guardiões dos ateliês

se para tanto se despissem

de todos os setentrionais atavios

e apenas ao teu pano de toucado

se ativessem.



publicado por zé kahango às 04:22
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MULHER ANGOLANA

Mulher Angolana

que teus filhos entregas

à Terra imensa -

como teus lábios

de tenros talos sequiosa

de pèzinhos dos omonas -

que rápidos aprenderão

em correrias pelo seu chão

a trepar aos paus sem medo,

a matar a fome com goiabas...

 

Mulher Angolana

ainda teu olhar é de menina,

tens voz de vivida calma

e o olhar profundo e distante.

 

Ao pé de ti

o meu coração se encosta,

sente bater teus passos quentes,

certo de que sempre me acompanhas...



publicado por zé kahango às 04:21
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